sábado, 6 de junho de 2009

A menina e o mar

Naquela tarde o céu estava cinzento e as nuvens carregadas. Eu, sentada defronte para o mar, já não tão azul, lembrava da infância. As ondas estavam agitadas e seguiam um ritmo inquietante, o vento vinha de todas as partes e embaraçava meus cabelos que, confusos, espalhavam-se pela face embaçando a vista. O abrir e fechar de olhos atrelado a uma brisa que amaciava o ambiente me trouxeram uma sonolência. Deitei na areia, apesar da recente chuva estava seca e adormeci. Não demorou muito para o despertar, algumas gotas de chuva anunciavam a hora de partir. Levantei e, como se houvesse dormido uma eternidade, limpei os grãos envoltos em meu corpo. Logo espiei o ambiente, senti algo diferente, talvez um mormaço estranho. O mar estava com uma tranquilidade mórbida e o sol havia dado o ar da sua graça. Comecei a caminhar em direção ao ponto de ônibus e só então me dei conta das palavras de minha mãe..."não chegue em casa tarde, a cidade está muito perigosa". Perguntei o horário a uma senhora, mas ela surpreendentemente, se mostrou indiferente à minha indagação. Quando ia dirigir-me novamente a ela, meu ônibus apontou na esquina. Corri para alcançá-lo mas o motorista não esperou e, partiu. Indignada, voltei e me dei conta que uma multidão se formara no Pôrto. A noite já se anunciara, mesmo com um certo receio, fui ver o que havia ocorrido para saciar minha curiosidade. Um círculo de transeuntes se formou rapidamente em torno de algo na praia. Quando estava a caminho, questionei algumas pessoas sobre o ocorrido, mas estas com um semblante de piedade misturado a preocupação, não deram ouvidos. Fui tentando adentrar a multidão e escutei poucas palavras trocadas por duas mulheres próximas a mim:
- Coitada, tão jovem! Como pôde entrar no mar sozinha?
- Alguns salva-vidas levantaram a hipótese de ter sido suicídio, pois um pescador afirmou tê-la visto mais cedo mirando o mar com um ar sombrio.
Então mais curiosa fiquei, nunca tinha visto um morto em minha frente. Fui pedindo licença e me aproximando, as pessoas estavam se dispersando, iam remover o corpo. Quando finalmente consegui vê-lo, estava coberto por uma lona, apenas o pé estava à mostra, branco e enrugado. Então reparei uma fitinha vermelha presa ao tornozelo, era aquela com que meu avô me presenteara no natal.

5 comentários:

Rafiki Papio disse...

Lendo novamente gostei ainda mais...
Como saber o que é sonho ou realidade, se sou borboleta ou se sou príncipe?

Moíra disse...

Leve e lindo. Parabéns!

Unknown disse...

Menina Poulain. Me arrepiei e sinceramente, meus olhos encheram-se d'água.

Anônimo disse...

Um misto e prosa e poesia, Menina Poulain, agora estou ainda mais encantado.

Moema disse...

De uma graciosidade ímpar! ^_^